sexta-feira, 12 de março de 2010

Textículos de Décio Pignatari

"A partir daí (das observações de Walter Benjamin no livro A obra de arte no tempo de sua reprodutibilidade técnica), tem início a reversão do sistema de consumo da obra de arte: não é mais o espectador que vai ao objeto, mas o objeto que vai ao apreciador. (...) o cinema, mesmo no início da fase sonora, sofria os mesmos ataques que a intelligentsia move hoje contra a televisão. (tais) constatações vem em apoio das teses centrais de Marshall Mcluhan, segunda as quais o que está em causa e em crise é a primazia do sistema verbal e de sua lógica linear-discursiva, nos processos de informação e comunicação onde, de outra parte, um veículo novo (como a televisão) tende a "artistificar", tornar artístico o veículo anterior (o cinema, no caso): o veículo é a verdadeira mensagem e o seu "conteúdo" é o veículo anterior que, no processo, se artistifica; poderíamos acrescentar que ele se artistifica na medida em que se "artesaniza", em comparação com o veículo mais avançado. (...) já existe um mercado de consumo, de repertório alto, para a arte de vanguarda (toda arte do nosso tempo é arte de vanguarda), que assim busca defender-se contra a arte de massas, da qual tende ser metalinguagem (a pop arte não é senão metalinguagem da arte popular criada pelos meios de comunicação de massa). Podemos dizer que estamos assistindo a agonia final da arte: a arte entrou em estado de coma, pois seu sistema de produção é típico e não prototípico, não se prestando ao consumo em larga escala. Não há porque chorar o glorioso cadáver, pois de suas cinzas já vai nascendo algo muito mais amplo e complexo, algo que vai reduzindo a distância entre PRODUÇÃO e CONSUMO e para o qual ainda não se tem um nome: poderá inclusive continuar levando o nome do defunto, como uma homenagem póstuma: arte.”

"A colagem é a sintaxe provisória da síntese criativa, sintaxe de massa. A colagem é a montagem da simultaniedade, totem geral. É tempo de massa de de síntese, não de centralização. Não há mais tempo para textos, só para títulos. Textítulos, textículos. Só a NOVA BARBÁRIE abre a sensibilidade aos contatos vivos. Os Ushers, de Poe, chegam a um tal requinte dos sentidos que se podem suportar a grossura do paladar. A tecnologia chega a um tal ponto de requinte que passa a requerer o marco zero de uma NOVA BARBÁRIE para desobstruir os poro. Sociedade cada vez mais rica, vida cada vez mais pobre. O dinheiro é a leucemia. Os modelos de consumo de hoje são os modelos da produção de 40 anos atrás: vide Oswald de Andrade e o Tropicalismo do grupo baiano. É tempo de PRODUSSUMO. O estudante está para a universidade como o operário para a fábrica. O estudante é o operário da informação. Os estudantes repetem na superestrutura os modelos das lutas operárias infraextruturais do passado. PRODUSSUMO. O mundo do consumo substituído pelo mundo da informação, onde se travarão as grandes lutas. NOVA BARBÁRIE: campo aberto para os novos modelos da batalha informacional. As elites, particularmente as do ensino, estão podres de burrice: qualquer novo bárbaro sabe mais do que eles. Não é necessário que cada indivíduo possua automóvel para que se produza uma nova cultura. O mundo das coisas é para a posse, o mundo dos signos para a cultura. O artista é um designer da linguagem, ainda que marginalizado - e especialmente. É a guerrilha artística. É a NOVA BARBÁRIE. Atrás de cada mito freudiano se esconde um cifrão. A alegria coletiva é a prova dos nove: contatos em profundidade. Além das cifras. E contra os cifrões."

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