sábado, 4 de setembro de 2010

Sobre Inglaterra e Irlanda do Norte.

Ainda que ingleses e irlandeses tenham se enfrentado desde o século XII, quando o monarca inglês Henrique II conquistou e anexou a ilha da Irlanda por um curto período de tempo, o atual conflito tem origem nos séculos XVI e XVII. Paralelamente ao seu rompimento com o Vaticano - que fundou o Anglicanismo - a dinastia Tudor lançou a Inglaterra a uma nova tentativa de conquista da Irlanda. O sucesso da empreitada submeteu os irlandeses - católicos desde sua origem - ao governo de ingleses protestantes. A partir daí, milhares de colonos ingleses estabeleceram-se na ilha - especialmente na província de Ulster, no norte do território - discriminando, perseguindo e expulsando os nativos. Nas primeiras décadas do século XX, revoltas sucessivas resultaram na divisão da ilha: os católicos conseguiram a independência da República da Irlanda (Eire) em 1921, mas alguns condados do norte, onde os protestantes eram - e ainda são - maioria, continuaram atrelados à Inglaterra.

A divisão do território irlandês não satisfez a população católica do Ulster, forçada a continuar sob domínio britânico. Os mais exaltados deste grupo nacionalista partiram para a luta armada, incluindo o terrorismo. Extremistas protestantes responderam à altura. Desde o fim dos anos 60 confinadas em bairros separados por muros e cercas de arame farpado - na capital Belfast e em outras cidades importantes -, as duas comunidades trocam tiros e bombas. Neste período, mais de 3.600 pessoas foram mortas.

Os católicos da Irlanda do Norte, também conhecidos como republicanos, desejam o mesmo que os seus vizinhos do sul conseguiram - independência do Reino Unido. Seu objetivo final é integrar os condados que permaneceram sob controle da coroa britânica ao resto da República da Irlanda, acabando com a divisão territorial da ilha. Até 1998, a própria Constituição da República da Irlanda estabelecia que era um dever do país lutar pela anexação do norte protestante. O catolicismo é visto como ponto essencial desta questão pois serviu como catalisador da identidade nacional irlandesa durante a resistência contra a ocupação e as lutas pela independência.

Ao contrário dos católicos, os protestantes, tradicionalmente chamados de unionistas por sua vontade de permanecerem unidos à Grã-Bretanha, desejam que a situação continue como está. Querem manter-se cidadãos britânicos. Mas não querem, para isso, deixar o território irlandês, onde, apesar de sua origem britânica, muitas famílias estão estabelecidas há séculos.


A organização terrorista mundialmente conhecida como IRA (Exército Republicano Irlandês, na sigla em inglês) surgiu no ano de 1969, reivindicando para si o legado do IRA original - o exército que lutou contra a Inglaterra e conquistou a independência do Eire em 1921. Ao dedicar-se a matar civis na Irlanda do Norte e na Inglaterra, com explosões ou ações armadas, o IRA deu um caráter extremista à causa dos católicos republicanos. Em 1984, num de seus atos mais ousados, o grupo explodiu um hotel na tentativa de assassinar a primeira-ministra Margaret Thatcher. Já em 1991, o primeiro-ministro John Major escapou de um morteiro atirado contra a residência oficial do chefe de governo inglês. A violência do IRA, que sempre contou com o apoio financeiro de americanos descendentes de irlandeses, fez surgir vários outros grupos paramilitares, na maioria protestantes, dispostos a vingar suas vítimas. Atualmente, o IRA abandonou a luta armada, tendo mantido-se ativo apenas por meio de seu braço político, o partido Sinn Féin, católico de orientação marxista.

O período de escalada da violência na Irlanda do Norte, que recebeu o nome de "The Troubles" (os problemas), teve início no fim dos anos 60, quando a Associação de Direitos Civis do país, organização majoritariamente católica, promoveu uma série de marchas de protesto em todo o território, reivindicando igualdade de condições políticas entre católicos e protestantes. Diversas destas marchas terminavam em quebra-quebra e confrontos entre manifestantes e a polícia, leal à coroa britânica. Uma destas marchas, na cidade de Derry, em 1972, terminou em tragédia quando soldados britânicos abriram fogo contra os civis católicos, matando 14 deles. A partir do episódio, conhecido como Domingo Sangrento, o Reino Unido suspendeu a autonomia do Ulster e fechou a Assembléia Nacional norte-irlandesa. Em resposta, o IRA iniciou uma série de ações terroristas que só terminariam em 1998. Em 1972, tendo matado já mais de 100 soldados britânicos, o grupo explodiu 22 bombas no centro de Belfast, no dia chamado por alguns de Sexta-Feira Sangrenta. Onze pessoas morreram e 130 ficaram feridas. Seguiram-se quase 30 anos de conflitos entre o IRA e grupos paramilitares protestantes. Entre os episódios famosos, destacaram-se ainda o bombardeio do Rememberance Day, em 1987; a explosão de um shopping em Londres em 1996, que matou duas pessoas e causou centenas de milhões de dólares de prejuízos; e a explosão de um carro-bomba na cidade de Omagh em 1998, por dissidentes do IRA que se opuseram a um cessar-fogo assumido pelo grupo meses antes - o ataque matou 29 civis e feriu mais 330.

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