sexta-feira, 30 de julho de 2010

Malena, Giuseppe Tornatore.


O texto é ótimo, mas imagens são ainda melhores. O início do filme de Tornatore, os primeiros dez minutos são extraordinários, sensacionais. Vemos um caminhão rodando nas pequenas ruas de uma cidadezinha da Sicília, Castelcutò, anunciando que Il Duce faria um discurso à nação às 17 horas, e pedindo a todos que liguem seus rádios. Só depois entra a voz em off do narrador dizendo aquelas duas belas frases, e vemos o protagonista, Renato Amoroso (Giuseppe Sulfaro, um garotinho em seu primeiro trabalho no cinema, excelente), ganhando sua bicicleta, e depois correndo com ela até um grupo de garotos reunidos perto do mar.
Entrecortadas com essas cenas, vemos rapidíssimas tomadas, em close, de uma mulher que se veste. Há uma rapidíssima tomada dos pés descalços da mulher, com meias de nylon; depois outra rapidíssima, também em close, da mulher acertando a meia na liga; depois outra, igualmente rapidíssima e em close, da mão da mulher desligando o rádio. Renato está sendo admitido na confraria dos garotos, e os garotos estão esperando um grande acontecimento – estão esperando Malèna sair de casa e caminhar até o centrinho de Castelcutò.

E então a vemos pela primeira vez de corpo inteiro. Mamma mia, e que corpo, e que rosto, que monumento – Michelangelo gostaria de ter esculpido um rosto assim, um corpo assim. Parla, Bellucci!

Malèna caminha, os meninos olham; close rapidíssimo da saia de Malèna, para vermos a pequena protuberância da fivela da liga que segura a meia de nylon. Renato olha para baixo, a câmara mostra a calça curta de Renato e o pauzinho dele fica duro.

Os meninos correm por um atalho, para ver Malèna de novo, “a mais bela bunda de Castelcutò”, como diz um deles. A câmara mostra em close o rosto de Renato – mostrará diversas vezes, ao longo de todo o filme –, e percebemos que o que para os outros meninos é farra, é folia, para nosso protagonista é coisa séria. Renato está perdidamente apaixonado por Malèna, a mulher mais bela de Castelcutò, tão bela, tão espantosamente bela, que todos param e se viram para vê-la, os homens babando de desejo, as mulheres babando de inveja, ódio.

Malèna é casada com Nino Scordia (Gaetano Aronica), um rapaz que, pouco após o casamento, é recrutado pelo exército e enviado para a guerra no Norte da África – o espectador sequer o vê nesse início de filme. O pai de Malèna, o professor Bonsignore (Pietro Notarianni, ótimo, num papel pequeno mas importante), dá aula de Latim, e é surdo. Na classe de Renato, um garoto mais gaiato ergue o braço, como se fosse pedir licença para ir ao banheiro, e diz:

- “Professor, posso comer sua filha?”

E o pobre e surdo professor: – “Vá, mas não demore” – e a classe estoura na gargalhada.

Renato segue os passos de Malèna sempre que pode; até mata aula para segui-la de longe. Depois vai se arriscando mais, vai se aproximando mais e mais da casa dela, acaba por observá-la através de buracos nas janelas. Só pensa nela; vai atrás do disco com a canção que ouviu através da janela da casa dela, “Ma l’amore no”; sonha acordado com ela; masturba-se mil vezes pensando nela.

Sérgio Vaz.

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