sexta-feira, 5 de junho de 2009

Maria Maria

"Que mais te queria o pobre, perguntou, e Maria, sem saber que palavras suas poderia dizer, só soube responder, Do barro ao barro, do pó ao pó, da terra à terra, nada começa que não acabe, nada acaba que não comece, Foi isso que ele disse, Sim, e também disse que os filhos dos homens brilham nos olhos das mulheres, Olha para mim, Estou a olhar, Parece-me ver um brilho nos teus olhos, foram palavras de José, e Maria respondeu, Será o teu filho.

O crepúsculo tornara-se azulado, ia tomando já a primeira cor da noite, agora via-se que de dentro da tigela irradiava como uma luz negra que desenhava sobre o rosto de Maria feições que nunca haviam sido dela, os olhos pareciam pertencer a alguém muito mais velho. Estás grávida, perguntou enfim José, Sim, estou, respondeu Maria, Por que não mo disseste antes, Ia dizer-to hoje, esperava que acabasses de comer, E então chegou esse pedinte, Sim, De que mais falou, que o tempo deu sem dúvida para mais, Que o Senhor me conceda todos os filhos que tu quiseres, Que tens aí na tigela, para que dessa maneira brilhe, Terra tenho, O húmus é negro, a argila verde, a areia branca, dos três só a areia brilha se lhe dá o sol, e agora é noite, Sou mulher, não sei explicar, ele tomou a terra do chão e lançou-a dentro, ao mesmo tempo disse as palavras, A terra à terra, Sim."

(O Evangelho Segundo Jesus Cristo, José Saramago)


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