quinta-feira, 28 de maio de 2009

SALA DE RASGAÇÃO DE SEDA: GILBERTO GIL.



Os Pastores da Noite
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Clara Arreguy: Ao longo das décadas, como compositor, intérprete ou cidadão, Gil sempre teve postura de agitador. Foi vereador, candidato a cargos eletivos em eleições ganhas e perdidas, filiado a partido político. Sempre se posicionou. De seu modo particular, elíptico, rococó, elabora pensamentos e frases marcantes, muitas vezes motivos de chacota pelos medíocres de plantão, mas nunca consideradas formulações de alguém pouco inteligente. Nunca sossega, nunca pára quieto. Pouco antes de se tornar ministro da Cultura, emendou projetos tão díspares e bacanas quanto o Percpan (Panorama Percussivo Mundial), a pesquisa de reggae na Jamaica, show e álbum com Milton Nascimento, a trilha do filme Eu, tu, eles, só de forró, o filme Viva São João e o disco São João vivo, sobre as festas populares no Nordeste. Pouco? Não para ele.

Os Pastores da Noite
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Os Pastores da Noite
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Dorival Caymmi: Gil é muito cuidadoso com o que sabe e faz: lidar com a música, com a letra, com o acompanhamento. Ele é completo, talentoso, tem uma presença muito boa. Um timbre de voz excelente. Gil contagia, é um criador, um valente, um tipo de artista brasileiro com toque universal bem acentuado. Ele não tem cerimônia de andar por qualquer caminho. Vai e domina, com um estilo próprio, inconfundível. Em poucas linhas, pode-se dizer o seguinte: a cada quarto de século, no mínimo, é que pode aparecer um artista desse tipo.


Arnaldo Antunes: Essa entrega, esse espírito aberto ao mundo, essa leitura pessoal da exigência de cada circunstância e sua transformação em auto-exigência, como traço da personalidade de Gil, acabaram se traduzindo, sem paradoxo, em intervenção radical, convicta, afirmativa das questões que foram compondo seu ideário. Gil teve sempre a coragem de dizer as coisas que acreditava nos momentos precisos. (…) Sua quietude inquieta deu conta de abordar e abraçar, com lucidez visionária, questões tão diversas como a contracultura, o sincretismo religioso, a negritude, a valorização da informação cultural africana e oriental entre nós, a ecologia, a política, a tecnologia, o carnaval, a macrobiótica, a cultura pop, a ciência, a meditação, as relações familiares, as relações de amor e amizade, as relações sociais, as relações de trabalho, a ancestralidade, o mundo moderno e a consciência primitiva – em formas que transitam livremente entre o baião, o funk, o rock, o afoxé, o samba, o reggae etc. e ao mesmo tempo sem ser nada disso; cumprindo apenas o sotaque particularíssimo do violão.


Os Pastores da Noite
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Caetano Veloso: Gil pra mim é a música. Meu único estudo de violão foi olhar as mãos de Gil tocando. Não posso deixar de pensar que tudo o que Milton Nascimento destila, tudo o que o Bob Marley significa, tudo o que Stevie Wonder pode é apenas o que Gil deixou de fazer. Porque quis, porque é brasileiro, porque é ele. Essa distorção me faz também ver claro. Smetak fala sempre nos Gêmeos quando se refere a nós. Gil caminha no escuro, no futuro, perto do Ser. Eu não acredito em nada: acendo os faróis dos sóis dos meus olhos sobre opacos objetos diretos e pareço pisar firme. Que eu seja aqui o obscuro. Compreendamos Gil. Ele nos ama bem mais do que podemos suspeitar.


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