sexta-feira, 8 de junho de 2012

Vadia, sim! [Leonardo Sakamoto]


O homem é programado, desde pequeno, para que seja agressivo. Ganha armas de brinquedo, espadas, luvas de boxe. Raramente a ele é dado o direito que considere normal oferecer carinho e afeto para outro amigo em público. Manifestar seus sentimentos é coisa de mulherzinha. Ou, pior, de bicha. De quem está fora do seu papel.

Já atravessamos uma revolução sexual. Podemos fazer sexo de forma mais livre e com menos culpa que antes. Mas expressar nossos sentimentos é algo longe de acontecer livremente. Como já disse o psicanalista Claudio Picazio, chegou a hora de passarmos por uma transformação afetiva, começar a entender que tem direito ao afeto, às emoções, a sentir. Passar a ser homem e não macho. Em outras palavras, o homem hetero precisa fazer sua revolução masculina.

Com isso, talvez entendessemos melhor o outro. Hoje, bater em “vadia” e “bicha” pode. Assim como em índio e “mendigo”. E, na maioria das vezes, a culpa recai sobre a própria vítima. Afinal de contas, quem são eles para não se encaixarem? Quem são eles para acharem que podem ser melhores do eu, sendo diferentes do que aprendemos como o “certo”? Bem-feito. Vestida assim, ela estava pedindo.

As pessoas envolvidas em casos de violência contra mulheres colocam em prática o que devem ter ouvido a vida inteira: quem não se enquadra em um padrão moral que nos foi empurrado – e que obedece aos parâmetros masculinos, heterossexuais e cristãos – é a corja da sociedade e age para corromper o nosso modo de vida e tornar a existência dos “cidadãos pagadores de impostos” um inferno. Seres que nos ameaçam com sua liberdade, que não se encaixa nos padrões estabelecidos pelos homens de bem. Sim, quando uma mulher não pode escolher como se vestir sem medo de ser importunada, ofendida ou violentada toda a sociedade tem uma parcela de culpa. Pelo que fez. Pelo que deixou de fazer.

Muitas mulheres são vítimas de violência doméstica, enfrentam jornadas triplas (trabalhadora, mãe e esposa), não têm a mesma liberdade que os meninos quando pequenas – que dirá conduzir livremente sua vida e suas roupas, pressionadas não só por pais e companheiros ignorantes mas também por uma sociedade que vive com um pé no futuro e o corpo no passado. A qual todos nós pertencemos e, portanto, somos atores da perpetuação de suas bizarrices. Discutimos muito sobre as mudanças estruturais pelas quais o país tem que passar, citando saúde, educação, transporte, segurança, mas esquecemos do respeito mínimo aos direitos fundamentais. Problemas que não conhecem classe social, cor ou idade. Como as mulheres que são maioria – e minoria.



Release: Liebe Paradiso.


Uma inspirada coleção de canções de Celso Fonseca e Ronaldo Bastos, em arranjos e interpretações que somam experiências de dois momentos diferentes, numa engenharia ousada e livre a serviço da música. As canções de “Paradiso” (1997), segundo disco da trilogia autoral de Celso Fonseca e Ronaldo Bastos (os outros são “Sorte” de 1994 e o influente “Juventude / Slow Motion Bossa Nova”), ressurgem com mais força ainda graças a um projeto diferente, concebido ao longo de dois anos. A produção do engenheiro carioca Duda Mello junto ao produtor uruguaio radicado no Rio de Janeiro Leonel Pereda procurou valorizar a beleza de elementos originais das gravações de 1997 e criou novas situações, nas quais houve lugar para novas vozes e instrumentistas, poemas em várias línguas, sons industriais e naturais, timbres eletrônicos, instrumentos exóticos, barulhos captados nas cidades, passagens construídas e espontâneas entre as faixas. 

O disco ainda traz duas gravações completamente novas: “O Tempo Não Passou”, originalmente registrada em “Sorte”, e “A Thing of Beauty”, um poema de John Keats musicado por Celso Fonseca e com citações a “Juventude”, do disco “Juventude / Slow Motion Bossa Nova”.


As novas gravações foram realizadas em 2009 e 2010 entre o Rio de Janeiro e São Paulo, e o álbum, além de Celso Fonseca, traz uma constelação de artistas excepcionais de várias gerações, como Nana Caymmi, Milton Nascimento, Paulo Miklos, Marcos Valle, Luiz Melodia, Adriana Calcanhotto, Sandra de Sá, João Donato, Kassin, Sacha Amback, Robertinho Silva, Nivaldo Ornelas, Alberto Continentino, Domenico Lancellotti, Armando Marçal, Carles Campi Campón, Jota Moraes, Dado Villa-Lobos, Pedro Sá, entre muitos outros. A magia de Liebe Paradiso renasce a cada audição, por isso é recomendável apreciar o disco como se lê um livro, do início ao fim. E em alto e bom som...

Produzido por Duda Mello | Co-produzido por Leonel Pereda | Direção Artística Ronaldo Bastos. Featuring Adriana Calcanhotto : Alberto Continentino : André Telles : Antonio Cícero : Antonio Dias : Armando Marçal : Arthur Maia : Bernardo Bosisio : Beto Martins : Bob Wolfenson : Cafi : Carles Campi Campón : Christian Kellersmann : Dado Villa-Lobos : Domenico Lancellotti : Donatinho : Johann Wolfgang von Goethe : Jaques Morelenbaum : João Donato : John Keats : Jorjão Barreto : Jota Moraes : Kassin : Lin Lima : Luiz Alves : Luiz Melodia : Marcelo Costa : Marcelo Mariano : Márcio Montarroyos : Marcos Suzano : Marcos Valle : Milton Nascimento : Nana Caymmi : Nivaldo Ornelas : Paulo Miklos : Pedro Sá : Renato ‘Massa’ Calmon : Robertinho Silva : Sacha Amback : Sandra de Sá : Vittor Santos : Walter Costa.
 

 
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